
Um dia, estava a dar uma simples aula de gramática sobre “there” vs. “their” vs. “they’re” (ainda me surpreende como é que fui capaz de formular um pensamento coerente durante esta fase, mas estou a divagar), quando olhei para as caras dos meus queridos alunos japoneses e percebi que já não havia caras queridas e sorridentes. Em vez disso os rostos estavam distorcidos com pele áspera, os olhos pretos com pupilas de gato vermelhas e dentes afiados a sair das suas bocas. Fiquei tão chocado que deixei cair o giz que estava a segurar e quase caí da plataforma de madeira que estava sob o quadro. Tive que sair da sala e ir à casa de banho lavar a cara. Recompus-me e voltei para a sala de aula. Desta vez, todos os alunos pareciam normais, embora com olhares preocupados.
Não tinha ideia do que estava a acontecer. Nunca tinha tomado qualquer tipo de droga estupefaciente e nunca tinha tido uma alucinação antes, mas a este ponto estava bastante claro para mim que o que me tinha acontecido era uma genuína alucinação. Fiquei com vergonha de contar aos meus colegas o que tinha acontecido e não queria ser despedido por ser considerado um lunático, que era como me sentia na altura. Liguei a alguns amigos e familiares e contei-lhes o que tinha acontecido na sala de aula. Todos disseram para ir ao médico assim que pudesse. Foi um bom conselho e assim o fiz.
Fui a um médico local que também falava inglês para que pudesse ser mais fácil descrever com precisão a minha situação, sem ter que recorrer a gestos e a palavras japonesas básicas que aprendi. Ele perguntou-me pela minha rotina diária e se eu andava a sentir algum desconforto no meu corpo. Contei-lhe que, além da dor que sentia por ter caído, estava bem, mas não andava a dormir muito. De seguida, ele perguntou quantas horas andava a dormir por noite. Eu tinha um FitBit, por isso conseguia dizer com bastante precisão que estava a dormir 2 a 4 horas por noite. Consegui ver a lâmpada na sua cabeça a apagar-se quando mencionei a falta de sono. Ele disse-me que, quando não dormimos o suficiente, o nosso cérebro fica efetivamente “em chamas”, como se estivéssemos a tomar uma droga pesada. Basicamente, a mente puxa de várias zonas diferentes do cérebro de forma confusa, o que pode, por sua vez, levar a alucinações.
Depois de repor todo o descanso necessário (dormi praticamente o fim de semana todo), comecei a pesquisar sobre a falta de sono e a ligação com alucinações. Os resultados foram fascinantes. As primeiras coisas que notas em ti, ou outras pessoas notam em ti, devido à falta de descanso, é uma mudança de humor. As pessoas nem sempre sabem quando estão a sofrer de falta de dormir e a quantidade de horas de sono necessária varia de pessoa para pessoa. Sete horas podem ser suficientes para a Sara, mas o Miguel pode precisar de oito ou nove horas para funcionar no nível máximo. Os humanos são muito bons a “sobreviver” com pouco sono, mas isso não os impede de sofrer de privação de sono. Irás perceber isso quando tu ou outra pessoa ficar mais irritada e mostrar pouco positivismo nas expressões faciais. Uma pessoa pode expressar que está feliz, mas o sentimento não chegará aos seus olhos e também terá dificuldade em convencer outras pessoas de que está realmente feliz. Da mesma forma, as emoções positivas podem ser mal interpretadas por alguém que não dorme bem, muitas vezes associando a felicidade dos outros como negatividade ou neutralidade.
Depois de uma pessoa ficar acordada por mais de 24 horas, os micro-sonos podem começar a ocorrer. Micro-sono acontece quando uma pessoa adormece por curtos períodos de cerca de 30 segundos ou menos. Quando uma pessoa tem um micro-sono, o seu cérebro pára de processar informações e fica cego durante um momento, mesmo que os seus olhos fiquem abertos. O delírio também pode ocorrer durante esta fase, muitos contam que se sentiram desorientados ou tolos após um período sem dormir. No meu caso, lembro-me de andar muito esquecido e rir mais do que o normal enquanto estava com privação de sono.
A maioria das pessoas que têm alucinações geralmente reportam ao fim de 36 a 48 horas sem dormir. É extremamente difícil ficar acordado por tanto tempo porque o corpo exige que descanses um pouco, mas em certas condições e circunstâncias, uma pessoa pode não dormir e, assim, ser vítima de alucinações. A explicação científica ainda é desconhecida, mas pode estar relacionada com partes do cérebro que são responsáveis pelo processamento da visão estarem mais perturbadas. Os níveis de dopamina também podem ser os culpados, pois a quantidade produzida irá variar mais esporadicamente num estado de privação de sono. Relatórios de psicose de alguns indivíduos que permaneceram acordados por 72 horas ou mais, resultando na necessidade de auxílio psiquiátrico. Esta é uma das razões pelas quais a privação do sono é considerada uma táctica de tortura ilegal na maioria dos países.
Após o meu incidente de alucinação assustador, comecei realmente a valorizar o meu sono. Mesmo quando tenho muito trabalho para fazer, tento ter 8 horas completas de descanso todas as noites. Se estás curioso para saber como te deves preparar melhor para um sono de boa qualidade, lê o nosso artigo sobre Rotinas Noturnas. Posso garantir que nunca mais atingirei os níveis de alucinação da Alice no País das Maravilhas depois desta minha experiência no Japão!